Anagnórise

Não tem coisa mais interessante que o grego e mitologia grega; pode ser que tenha, mas no momento eu vou falar é do grego. O grego é uma viagem e todo o ocidente está impregnado por coisas daquele lugar. É enorme o legado...

Começando pela nossa língua, que tem origem também no grego, nosso modelo jurídico é grego, o carnaval nosso de todo ano tem características gregas, como as festas ao deus Dionísio, em agradecimento a boa colheita anual.  Eram verdadeiros bailes de máscaras em praça pública e desfiles alegóricos luxuosíssimos.

A nossa literatura tem muitos traços gregos, a primeira gramática quem escreveu foi um homem grego, Dionísio da Trácia. Quem nunca ganhou um presente de grego?

E o nosso teatro? É a coisa mais apaixonante que usamos do grego. Nossa vida cotidiana, muitas das vezes, é uma tragédia grega. E a todo o momento alguém passa por uma Anagnórise real, no momento   do conhecimento de um fato antes ignorado, e, que não é grego.

Um dos elementos essencial à tragédia grega é a Anagnórise, palavra grega, que significa Reconhecimento. Aristóteles definia assim: “o reconhecimento. A passagem do ignorar ao conhecer, que se faz para amizades ou inimizades nos destinos das personagens sejam eles de sorte ou desventura.” Ele ainda acrescenta: “A mais bela de todas as formas de reconhecimento é aquele que se dá juntamente com a peripécia”, como em Édipo, o Tirano ou Édipo Rei. Segundo Aristóteles: “Peripécia é a mutação dos sucessos no contrário.” Naquela época dos heróis, o inesperado. Hoje, com heróis diferentes, a resolução de problemas também no imprevisível, quando tudo parecendo que acontecerá de modo negativo... No fim, assertivo. “O reconhecimento pode ser a constatação de acontecimentos acidentais, trágicos, mas, quase sempre, se traduz na identificação de uma nova personagem, como acontece com a figura do Romeiro Frei Luís de Sousa.”

O personagem ganha um destino (anankê), passeia pela catástrofe que resulta do conflito entre a hybris – desafio da personagem – vive pelo sofrimento progressivo (pathos), e em algum momento de Anagnórise, até chegar ao clímax. Até que, então, a ação da tragédia nos provoque a Catarse ou Katharsis – purificação das paixões, expurgações das emoções, sensação de esvaziamento da alma.

Isso me deixa pensando sobre quem imita quem, sobre o mundo indiscutível e imutável das narrativas gregas antigas, sobre como, embora modernos, dialogamos com aquele tempo tão distante, mesmo sem percebermos; e, em nosso cotidiano, muitas pessoas conseguem enxergar-se dentro dessas narrativas.

Tudo isso me faz sentir uma Anagnórise diária sobre como eu sou bastante grega.